Apesar do desenho mais inclusivo, o sistema eleitoral ainda é marcado pela subrepresentatividade de diversos grupos. O tema foi discutido na seção Enfoque do VII Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral na noite de quarta-feira (19/8), sob a moderação do advogado Luiz Magno Pinto Bastos Júnior. O painel contou com exposições das advogadas Cristina Neves e Juliana Freitas e da jornalista Claudia Werneck, idealizadora e fundadora da Escola da Gente.
Depois das saudações iniciais, Cristina Neves começou sua apresentação com uma autodescrição, dirigindo-se às pessoas cegas. Em seguida, estabeleceu a diferença entre igualdade formal e material, observando que a representatividade passa pelo segundo tipo. “Na igualdade formal estipula-se que todos devem partir do mesmo lugar. Para a igualdade material é preciso levar em conta o conceito aristotélico de tratar desigualmente os desiguais. É como se colocássemos alguns atletas para partir mais à frente numa corrida, de modo equilibrar as oportunidades”, observou Cristina. Para a advogada, a subrepresentatividade afeta ainda mais alguns grupos. “Quando falamos da subrepresentação LGBTI+, por exemplo, o primeiro desafio é garantir a vida das pessoas. O Brasil e sua Justiça Eleitoral ainda não conseguem dar a atenção devida aos grupos minoritários. Precisamos atacar as desigualdades sociais em diversas frentes, inclusive repensando o sistema eleitoral”, defendeu.
Juliana Freitas destacou que o problema da representatividade é estrutural, pois parte originalmente de um modelo androcêntrico que afronta os princípios da pluralidade e da igualdade. Para ela, não existe desenvolvimento sem inclusão ou com violação aos direitos fundamentais e aos direitos humanos. “Os representantes que escolhemos não espelham o caráter não-binário da nossa sociedade. As mulheres não estão nos postos de decisão. Diante desse problema de estrutural, precisamos pensar em políticas afirmativas. Não que resolvam a situação por si só, mas elas tornam mais célere o caminho da igualdade”, pontuou. Fazendo referência à fala da advogada Carla Karpstein no painel sobre financiamento e prestação de contas eleitorais, também transmitido na noite desta quarta-feira, Juliana também apontou a pandemia como um obstáculo extra para os grupos vulneráveis, dentre os quais figuram as mulheres. “As recomendações da Comissão Interamericana de Direitos Humanos para reduzir os impactos da pandemia. Tais recomendações não parecem estar sendo levadas em conta no Brasil, especialmente em relação às mulheres”, concluiu.

Comunicação acessível

A comunicação acessível foi o tema abordado pela jornalista Claudia Werneck, que também começou sua apresentação uma autodescrição. Ela relatou que se interessou pelo tema da acessibilidade depois de uma reportagem sobre a síndrome de Down, quando chefiava a redação da Revista Pais & Filhos. A atenção ao aspecto eleitoral foi mais recente e avançou quando a Escola da Gente, fundada por ela, foi premiada pela ONU numa cerimônia em que o Tribunal Superior Eleitoral também foi reconhecido, em 2019. ”Para mim, tudo é pouco. Afinal, são séculos de desprezo, descaso, desvantagem e muita dor. Todo o sistema dói e também é caro. Impedir a participação de todas as pessoas é um desperdício de dinheiro e energia. E por que a resistência em ampliar a participação? Porque a deficiência ainda é vista como um detalhe da natureza, como se as pudessem entrar e sair do debate, ficando ´em descanso´ parte do tempo. Claudia frisou que todas as pessoas têm o mesmo valor humano, que imutável; portanto, todos devem ter o mesmo acesso à informação e também idêntico direito de se expressar. “A comunicação envolve dois direitos: ser informado e se manifestar. Contudo, estamos vivendo a maior exclusão de pessoas com deficiência da história. Todo o fluxo de comunicação, já excludente no presencial, se intensificou no ambiente virtual, pela falta de comunicação acessível. As pessoas com deficiência foram tragadas exponencialmente pela exclusão. E é esse o teste que a Justiça Eleitoral terá de enfrentar nesta eleição”, apontou.